sábado, 29 de janeiro de 2011

Meu jardim



Gentilmente eu plantei flores no jardim das emoções.
Outrora capinava desejos, como se se alastrassem e tomassem posse do jardim, como ervas daninhas.
Onde há vida na terra, cresce mato. Para que não tome conta, é preciso roçar.
Roçando com delicadeza é possível não eliminar tantas flores que ainda não estão em sua maior beleza.
Regando com meiguice, é provável que não embeba demais as flores, nem que os espinhos machuquem, nem que o adubo fortaleça demais.
Na medida da dedicação, as borboletas aparecem. Majestosas. Docemente beijam o néctar e dividem a semente da vida com jardins secretos cerrados de mato escondidos nos mais profundos mausoléus.
Pássaros sorriem e cantam celebrando no altar de seu novo lar. Distribuem com seus bicos, formosura por todo lugar onde suas asas conseguem abranger, alimentando-se e compartilhando a experiência da liberdade.
Não vou me abater tanto já que muitas vezes esqueci de aguar, de proteger meu jardim, afinal ele carece de zelo. Uma vez, nesses momentos insanos da vida, as tarefas exaustivas me tomaram tanto a vitalidade que quase o jardim se acabou, secando a ponto de dar pena, achando que fosse impossível recuperá-lo.
Mas como a vida, o amor vigoroso do meu jardim e o solo fecundo eram tão ricos, que nas folhas secas, na angústia do meu egoísmo, as lágrimas jorraram e o fio condutor de vida estava presente para ser cultivado, ele pôde ser revigorado.
Não mais quero olvidar que trago um jardim para desenvolver, cultivar. Local que serve de festividade para todos meus queridos amigos conquistados deleitarem-se.
Sei que a vida pode me afastar do meu jardim algumas vezes, mas ele sempre será o solo úbere de nuances, aromas e júbilos, para repartir, exaltando a existência.
Em alguns momentos, fatigantes, meu jardim estará demasiado abastado, restando insuficiente período para se reaver dos convidados continuamente bem-vindos. Todavia alguns amigos trazem consigo mais sementes para nutrir meu jardim, mantendo-o sempre vivo e acessível.

terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Eu não tenho filosofia: tenho sentidos...
Se falo na Natureza não é porque saiba o que ela é.
Mas porque a amo, e amo-a por isso,
Porque quem ama nunca sabe o que ama
Nem por que ama, nem o que é amar...

Alberto Caeiro

sábado, 8 de janeiro de 2011

"Escrever é esquecer. A literatura é a maneira mais agradável de ignorar a vida. A música embala, as artes visuais animam, as artes vivas (como a dança e a arte de representar) entretêm. A primeira, porém, afasta-se da vida por fazer dela um sono; as segundas, contudo, não se afastam da vida - umas porque usam de fórmulas visíveis e portanto vitais, outras porque vivem da mesma vida humana. Não é o caso da literatura. Essa simula a vida. Um romance é uma história do que nunca foi e um drama é um romance dado sem narrativa. Um poema é a expressão de ideias ou de sentimentos em linguagem que ninguém emprega, pois que ninguém fala em verso."

Fernando Pessoa